sábado, 7 de outubro de 2017

ela envelheceu antes dele, mas vai sobreviver a ele.


Ela envelheceu antes dele, mas vai sobreviver a ele.
Sobreviver, aqui, significa viver mais que ele; eles se amam muito, estão vivendo muito. Isso aqui é: ele vai morrer antes dela.
Sobem a 13 de maio de mãos dadas; antes não. Antes aqui entendido como um tempo anterior, não antes da 13 de maio, na santo antônio, que foi de onde vieram, antes, aqui, o tempo de namorados; no tempo de namorados não andavam de mãos dadas. Talvez o carro. Talvez o mal jeito dele, difícil de se entender, de falar e de demonstrar amor. Ela sempre muito dependente dele, ele decidindo tudo, trabalhando muito, mas não andavam de mão dadas.
Sobem a 13 de maio, de mãos dadas; vão à academia. Casal fitness. Os dois tem mais de sessenta, ele quase setenta; como se diz por aí: não aparentam!
Ela sofre; dores difusas e variadas,não gosta de ginástica. Não gosta do ambiente, não gosta de exercícios físicos, de espelho e etc. .
Ele cada dia mais empenhado, finge que não tem dores difusas e variadas, e, principalmente, esconde a dor do peito.  Entrega-se, ele, à uma rotina de exercícios puxados; uma série vigorosa de dar inveja à garotões de trinta. Dezenas de repetições. Com renovadas forças vai todo dia à academia. Ela, dia-sim, dia-não. Preferia não ir, mas ele pede, exige.
Ela deu uma bela envelhecida; Botox e plástica antes de melhorarem o visual acentuaram a passagem do tempo. Esticada e inchada, a pele, sem viço e realmente plastificada, diz que ela é velha. O braço é gordo. Estrias. Celulite que não é derrotada. Preguiça de ir à academia: lá tem gritaria. E também festa e bagunça; parece igreja de crente. Católica, gostaria de ir à igreja todo dia, envolver-se e dedicar-se mais; vai dia-sim, dia-não.
Ele deixou o escritório para o filho mais velho. Quando solicitado, dá um parecer: categórico, firme. Aposentado, como que renasceu; mais carinhoso,mais falante, mais passeios com a mulher. De mãos dadas.
Ela entende agora o jeito dele; o porquê da antiga distância, as poucas palavras. Entende também a antiga dependência, esperar o que ele dia decidir, que rumo iam tomar; agora andam juntos, de mão dadas. 
A dor que tem no peito credita aos muitos quilos que levanta muitas vezes. Pensa, ingenuamente, que talvez seja o amor que cada vez mais sente por ela.
Ela pensa: nunca estivemos tão próximos e felizes. Sem tantas responsabilidades vivem mais um para o outro, são mais próximos e entendem-se cada vez mais.
De mãos dadas sobem a 13 de maio; de mãos dadas cada vez mais apertadas. 
Ela envelheceu antes dele, mas vai sobreviver, eles sabem.


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